BIODIVERSIDADE: QUE CONCEITOS?




“Como a natureza sabe, sem diversidade não existe evolução.”
Isaias Raw

Um dos termos científicos mais divulgados na atualidade, em todo o mundo, é o conceito de biodiversidade. Assim, ao longo do primeiro texto que coloco no blogue pretendo mostrar como surgiu este conceito e atento explorar um pouco o seu significado. Impõe-se então que neste espaço virtual se reflita sobre questões como: De onde advém a origem do termo biodiversidade? O que é a biodiversidade?

Fonte: várias imagens retiradas do Google imagens- pesquisa em biodiversidade

Biodiversidade ou Diversidade Biológica tem a sua origem no grego bios – vida, e consiste na diversidade da natureza viva. A expressão Diversidade Biológica foi criada por Thomas Lovejoy (com data em 1980), já o conceito biodiversidade foi pela primeira vez usado pelo entomologista E. O. Wilson (com data em 1986), num relatório exposto ao I Fórum Americano sobre Diversidade Biológica, organizado pelo Conselho Nacional de Pesquisas dos EUA. O termo Biodiversidade, sugerido a Wilson pelos integrantes daquele Conselho Nacional, teve a pretensão de substituir a expressão diversidade biológica, por ser considerada menos eficaz em termos comunicativos. Desde modo, o conceito biodiversidade tem vindo a ser grandemente aplicado por biólogos, ambientalistas, políticos, e outros cidadãos no mundo, aplicação que tem vindo a coincidir com a crescente preocupação com a extinção das espécies que se vai verificando desde as últimas décadas do século passado.

“Apesar da utilização generalizada do conceito de biodiversidade (p.e., OTA 1987; Reid & Miller, 1989; MacNeely et al. 1990; Wilson, 1992; Johnson, 1993) ainda não foi possível operacionalizar nenhuma das múltiplas definições, com vista a possíveis aplicações em planeamento, ordenamento do território e conservação (p.e., Noss, 1990; DeLong, 1996; Gaston, 1996a). Não obstante a diversidade de propostas que visam reduzir o conceito de Biodiversidade a um espaço bidimensional, mensurável, de abcissas e ordenadas, afigura-se pouco provável que algum dia alguma medida venha a merecer o consenso (Norton, 1994). […] Para alguns autores (Williams, 1993) estamos em presença de um conceito “pseudocognitivo” na medida em que todos assumem partilhar a mesma definição intuitiva” (Araújo, 1998).

Ainda seguindo a linha de Araújo (1998), “as referências mais frequentes consideram biodiversidade como um conceito (p.e., variedade da vida - Wilson, 1992), uma entidade mensurável (p.e., riqueza mais equitabilidade - Magurran, 1988; grau de diferenciação taxonómica - Vane-Wright et al. 1991), ou uma preocupação sobre a redução acelerada da diversidade da vida (p.e., biodiversidade como sinónimo de conservação - Browman, 1993).”


• Foi a Convenção sobre a Diversidade Biológica, resultante da Cimeira do Rio (1992), que projetou uma série de metas com o intuito de conservar a biodiversidade e promover a distribuição justa e igualitária dos seus recursos, e expôs no artigo 2º a biodiversidade como a “variabilidade entre os organismos vivos de todas as origens, incluindo, inter alia, os ecossistemas terrestres, marinhos e outros ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos dos quais fazem parte; inclui a diversidade dentro de cada espécie [ao nível genético], entre as espécies e dos ecossistemas.”

A noção de diversidade biológica, inclui portanto, três níveis hierarquizados de biodiversidade:
- o nível genético compreende a variabilidade genética intra-específica, seja entre populações separadas ou entre indivíduos de uma mesma população.
- a diversidade ao nível das espécies inclui todas as espécies existentes numa determinada área ou em todo o planeta.
- a diversidade ao nível dos ecossistemas, ou diversidade ecológica, inclui a diversidade de processos ecológicos intra e inter ecossistemas.

Quanto à quantificação da diversidade existente pode ser abordada segundo três vertentes: variedade, abundância e distribuição. O modo mais comum de medir biodiversidade baseia-se na contabilização da variedade de tipos diferentes (seja ao nível genético, de espécies, ou de outro nível taxonómico) existentes numa determinada área em determinada altura. No entanto, este tipo de medida nem sempre é o mais informativo, dado que estimar a abundância, ou seja, saber quanto existe de cada tipo, poderá revelar-se mais interessante para o estudo da biodiversidade. Por último, a distribuição da diversidade de tipos numa determinada área poderá revelar padrões espaciais na forma como a biodiversidade se distribui. "Tanto a variedade como a abundância e a distribuição são componentes importantes da biodiversidade, podendo ser mais ou menos relevantes para o fornecimento de determinados serviços de ecossistema (e.g. a regulação de pragas depende do efectivo, ou seja abundância, das populações de inimigos naturais)." (ptMA, 2013)

O termo biodiversidade inclui as espécies domesticadas ou cultivadas, isto é, aqueles organismos cuja evolução se encontra associada a processos de seleção e melhoramento efetuados pelo Homem, para satisfazer as suas próprias necessidades. Igualmente, os ecossistemas geridos pelo Homem, como os campos agrícolas, estão incluídos na definição de diversidade de ecossistemas.

Embora se desconheça o número exato de espécies existentes, até ao momento foram identificadas 1,7 milhões, sendo a grande maioria organismos de pequenas dimensões (verificar quadro I). No entanto, e embora as estimativas do número total de espécies envolvam uma grande incerteza, estima-se um mínimo de 5 milhões e um máximo de 100 milhões (ICNF, 2013). Todas estas formas de vida têm resultado num longo processo evolutivo, durante o qual a vida na Terra tem sido capaz de se adaptar às contínuas pressões e alterações do ambiente.




Quadro I Quantificação de espécies conhecidas no mundo
Adaptado de: http://www.uff.br/cienciaambiental/biblioteca/geobrasil/biodiversidade.pdf, acedido em 21.03.2013


A Biodiversidade não se distribui de igual forma nas diferentes zonas da Terra, é sem dúvida, maior nas zonas tropicais. Myers procurou identificar quais as regiões que concentravam os mais altos níveis de biodiversidade e onde as ações de conservação seriam mais urgentes, ele chamou a essas regiões de Hotspots de biodiversidade (Mapa 1). A riqueza de espécies tende a variar de acordo com a disponibilidade energética, hídrica e também com suas histórias evolutivas. “Quanto maior a latitude, menor o número de espécies, e as populações tendem a ter maiores áreas de ocorrência. Este fenômeno, que envolve disponibilidade energética e mudanças climáticas em regiões de alta latitude, é conhecido como efeito Rapoport” (Barbieri, 2010).

Mapa 1 . Distribuição dos Hotspots de biodiversidade na Terra
Fonte: http://www.veracel.com.br/Portals/0/Estacao/Hot%20Spots.gif, acedido a 22.03.2013


Para finalizar refiro que, embora o termo biodiversidade assuma diferentes conceções, conclui-se que a biodiversidade tem uma importância inegável. E face à situação de crise nas relações do Homem com a Natureza, têm surgido alguns princípios éticos voltados para a questão da Biodiversidade. Neste âmbito, merece destaque a obra do brasileiro Josafá Carlos de Siqueira por destacar princípios éticos específicos à biodiversidade. Um dos princípios consiste na antecedência histórica, biológica e evolutiva, pois a diversidade da vida no planeta é anterior ao surgimento da espécie humana e, portanto, deve ser respeitada. Outro dos princípios insiste na dimensão subjetiva dos seres vivos, contrapondo a abordagem objetiva que historicamente predominou. Dessa forma, os seres que integram os biomas e ecossistemas têm valores e direitos, devendo, portanto, ser respeitados e preservados. Existe recentemente o princípio do valor desconhecido, ou seja, a “megabiodiversidade” nos trópicos é depositária de um património biológico e axiológico ainda desconhecido, tanto pelas ciências como pela sociedade, justificando assim os esforços de preservação dos biomas e das espécies.

“Finalmente, o papel da Biodiversidade é ser um espelho das nossas relações com as outras espécies de seres vivos, uma visão ética dos direitos, deveres e educação”. (RSB, 2013)




Referências bibliográficas:

Araújo, M. (1998) "Avaliação da biodiversidade em conservação", Silva Lusitana, 6(1):19-40 .
Bacelar-Nicolau, P. e Azeiteiro, U.M. (2010) “Biodiversidade e Serviços dos Ecossistemas” (documento vídeo).
Barbieri, Edison (2010). Biodiversidade: a variedade de vida no planeta Terra. Centro Avançado de Pesquisa Tecnológica do Agronegócio do Pescado Marinho. Instituto de Pesca. APTA (Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios), consultado a 20.03.2013 de 2013, em ftp://ftp.sp.gov.br/ftppesca/biodiversidade.pdf
Bryant, P.J. (2005) Capítulos 1, 2, 7. In Biodiversity and Conservation - a hypertext book.
Christie, M. et al. (2006) "Valuing the diversity of biodiversity", Ecological Economics, 58:304-317.
Convenção sobre a Diversidade Biológica: implementação na União Europeia (2006). Comissão Europeia. Direcção-Geral do Ambiente. Acedido a 20.03.2013, em http://ec.europa.eu/environment/biodiversity/international/pdf/leaflet_pt.pdf
ICNF (2013). Portal do Instituto da Conservação da Natureza e Florestas. Acedido a 21.03.2013, em http://www.icnf.pt
Lovejoy, T. “Biodiversity: what is it?” In Biodiversity II.
Mapa 1 Distribuição dos Hotspots de biodiversidade na Terra. Acedido a 22.03.2013, em http://www.veracel.com.br/Portals/0/Estacao/Hot%20Spots.gif
Millennium Ecosystem Assessment (2005) pp. 1-41. In Ecosystems and Human Well-being: Biodiversity Synthesis. World Resources Institute, Washington, D.C.
ptMA (2013). Portal Millennium Ecosystem Assessment. Acedido a 21.03.2013, em http://ecossistemas.org/
Quadro I Quantificação de espécies conhecidas no mundo. Adaptado de "O Estado da Biodiversidade". Geo Brasil 2002. Acedido a 21.03.2013, em http://www.uff.br/cienciaambiental/biblioteca/geobrasil/biodiversidade.pdf
REA (1999). Portal Relatório do Estado do Ambiente. Acedido a 21.03.2013, em http://www.iambiente.pt/rea99/rea99.htm
RSB (2013). Portal RSBiodiversidade. Acedido a 20.03.2013, em http://www.biodiversidade.rs.gov.br/portal/index.php
Wilson, E.O. (1988) "The current state of biological diversity ". In Biodiversity. National Academy Press, USA.

Comentários

  1. De acordo com Wilson (1988), o desconhecimento acerca do numero exato de espécies existentes na Terra prejudica a estimativa sobre o numero de espécies que serão extintas de seus habitats, sendo essas taxas de extinção estimadas indiretamente pelo principio da biogeografia.

    A estimativa feita por Myers em 1984 revelou que 7.000 tipos de plantas são utilizados para alimentação, sendo que ainda há cerca de 75.000 tipos de plantas comestíveis (Wilson, 1988). Tal informação sinaliza a pouca informação e conhecimento sobre os habitats, suas espécies e utilizações, ou seja, sobre a vida que habita o planeta e suas inter-relações.

    Por outro lado, estima-se que dado 10 milhões de espécies da fauna e da flora de todos os habitats do mundo, a perda é de aproximadamente uma para cada uma mil espécies por ano. Dentre os diferentes ecossistemas, as florestas tropicais são as que mais recebem atenção e preocupação, visto que apesar de atualmente ocuparem apenas 7% da superfície terrestre, essas áreas contem mais da metade das espécies da biota do mundo.Sabe-se que a fragmentação das florestas tropicais leva à extinção de espécies, sendo que quanto menor a área, maior a taxa de extinção (Wilson, 1988).

    Na América Latina, apenas 7% das florestas são protegidas (Wilson 1988 apud Brown, 1985). No Brasil, foram desmatadas: 88% da área da Mata Atlântica (até 2010); 49% da área do cerrado, 54% da área da caatinga e do pampa (até 2009) e o pantanal, 15% de suas áreas. Por outro lado, IBGE (2012) aponta que nos últimos anos houve um crescimento da criação de áreas protegidas no Brasil, em quantidade e extensão, sendo a Amazônia o bioma mais protegido (16% de sua área total em unidades de conservação federais). Já os outros biomas somam apenas 5% de área protegida, valor abaixo da média mundial (IBGE, 2012).

    Diante desse contexto, onde o desmatamento, as queimadas e a conversão de campos em pastagens são alguns dos principais ameaças biodiversidade, os dados sobre as espécies ameaçadas de extinção não podem ser animadores. Em 2005, 627 espécies da fauna brasileira encontram-se listadas como ameaçadas de extinção, onde metade desse valor está classificado como “vulnerável”. Os grupos qie apresentam maior numero de espécies ameaçadas são as aves (160), os peixes de água doce (142) e os insetos (96). Quanto Às espécies ameaçadas de extinção que compõem a flora, observou-se um aumento no numero de espécies da lista divulgada em 2008, em relação à divulgada anteriormente, em 1992 (IBGE, 2012).

    Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) 2012, Indicadores de Desenvolvimento Sustentável Brasil 2012, Autor, Rio de Janeiro.

    Wilson E O 1988, ‘The Current State off Biological Diversity’ in Biodiversity, National Academy Press, Washington, D.C.

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